Que bom é
ver o homem reciclar para poder conservar e preservar a natureza e o meio em
que vivemos. Atualmente vemos várias manchetes na mídia mostrando como o homem
tem se tornado um ser “consciente”, isto devido ao fato deste mesmo homem
tentar re-utilizar materiais que podem ser reciclados. Caso não exista uma
“conscientização” para a reciclagem, novas matérias-primas deverão ser
retiradas da natureza e empregadas na produção, causando mais desequilíbrios ao
já desequilibrado meio-ambiente. Com a busca de mais matéria-prima, existe uma
tendência a aumentar os efeitos nocivos do desmatamento e com isso um
crescimento dos impactos ambientais e com eles todos os problemas que isto
acometeria. É certo que a idéia de reciclagem vem servindo como fonte de renda
e empregos às centenas de menos afortunados das classes mais baixas do Brasil
(se é que ainda existe uma estrutura ou pirâmide social confiável).
A realidade que está por trás da “estória” não é esta que vemos nos jornais e demais meios de comunicação, da qual existe uma idéia disforme que há uma “conscientização” da sociedade e dos industriais no que cerne a mitigação da poluição e a conseqüente solução da problemática ambiental.
Dados atuais afirmam que é muito mais vantajoso para um industrial, ou outro tipo de empresário, reciclar um bem para diminuir despesas do que produzi-lo da matéria-prima bruta[1]. Então, esta duvidosa “conscientização” ambiental não passa de uma nova retomada da busca por lucros imediatos (ou a mais valia) que estes empresários/industriais almejam. Não nos enganemos ao pensarmos que existe algum agente/ator com direcionamento somente ao bem comum da coletividade, pois esta idéia é utópica.
Certa vez (ano de 2003), num domingo na Praça da República, em Belém do Pará, fiz um teste com o objetivo de verificar em quanto tempo uma latinha de alumínio passaria exposta no chão, sem que algum catador de lixo/latinha viesse pegá-la, sendo que este teste poderá ser feito em qualquer capital do país[2] e o resultado será similar: joguei uma latinha de alumínio no chão e em média de 13 a 20 segundos, a mesma lata, é apanhada por uma outra pessoa, seja ela mulher, homem ou criança. Este teste mostra uma “conscientização” pela preservação/conservação do meio ambiente ou somente mais um grave problema social que devemos resolver?
Em outro exemplo, cito o caso da maioria dos navios que trafegam pelos rios na Amazônia que, independentemente de os passageiros despejarem o lixo no local determinado da embarcação, este lixo é posteriormente jogado no próprio rio que tinha sido poupado anteriormente. A maioria das grandes cidades do Norte do país não possuem grandes indústrias de reciclagem ativas, como em algumas capitais do sudeste e sul do país, mas este fato não quer dizer que os amazônidas sejam mais ou menos “conscientes” que os curitibanos ou paulistanos, por exemplo, mas que este é um problema estrutural de caráter sócio-político, ou será que pelo fato de nas cidades do sul e sudeste haver uma indústria de reciclagem ativa eles são mais conscientes do que os nortistas?
A problemática ambiental não fica longe desta discussão, pois tem base em uma falta de conscientização por parte não somente da sociedade, que não separa e tenta reciclar seu lixo, mas também dos políticos que não direcionam a um destino final adequado o lixo que é produzido nas cidades, tanto o lixo doméstico quanto o lixo hospitalar. Esta não é uma retomada popular à “conscientização” - palavra que acho errônea, pois todos temos consciência do problema ambiental atual – mas a falta de implementação de políticas públicas direcionadas às pessoas de baixa renda que estão “garimpando” o lixo, e uma política, também, de educação ambiental nas escolas de todo o país, pois é na escola que o problema será solucionado. Dados extraídos da reportagem editada no Jornal do Brasil em 13/05/2002, por Mariana Flores, afirmam que:
A
reciclagem de latas de alumínio movimentou algo como R$ 850 milhões no ano
passado no Brasil. A estimativa mostra que o país está liderando o ranking mundial de aproveitamento de
latas para envasar bebidas. De todos os 10,5 bilhões de latas de bebidas
consumidas durante o ano de 2001, 85% foram recicladas. Estima-se que 150 mil
pessoas estejam vivendo da coleta e venda de latas de alumínio no Brasil. Cada
quilograma, com 75 latas, é vendido por R$ 1,60. Um brasileiro que recolhe a
lata e a vende para ser reciclada ganha, em média, o correspondente a dois
salários mínimos por mês.
Sendo que,
para o ano de 2004 o Brasil foi, pela quarta vez consecutiva, o país que mais
reciclou este tipo de lata no mundo (IBGE, 2004). Qual a moral da estória? Não
somos conscientes ou os políticos não oferecem condições oportunas de emprego e
armazenamento do lixo doméstico, hospitalar ou industrial? Na realidade a culpa
é de todos nós, já que, pelo fato de não sermos coerentes com a reciclagem, não
somos duros ao cobrar o direcionamento correto dos políticos eleitos, pois ao
seguirmos um padrão do dito “desenvolvimento sustentável” para a sociedade, devemos
verificar primeiramente o nosso quintal para ver o outro lado da rua.
* Publicado em
originalmente em C. N. Do velho ao novo: uma idéia sobre a reciclagem. O
Espaço do Geógrafo. Bauru - SP, v. 35, 2003, p. 3 - 3.
[1] A energia
desperdiçada na industrialização da matéria-prima bruta é muito menor quando
utilizada para remanufaturar materiais recicláveis, como papel, vidro,
alumínio, etc. Sendo que os materiais recicláveis ainda poupam grandes reservas
de recursos naturais, preservando, assim, o meio ambiente.
[2] Em locais
de intensa circulação de pessoas.
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