terça-feira, 26 de março de 2013

O ENSINO DOS MAPAS NA ERA DA (GEO)INFORMAÇÃO[i]

A forma de educar, de maneira rígida e sem críticas, foi notada durante um longo período nas disciplinas escolares que, durante anos, sofreram poucas modificações em seus conteúdos e no modo de ensinar utilizado pelo educador, considerado tradicional, inflexível e que inibia a criatividade do alunado. A principal característica do ensino tradicional se pauta em disciplinas meramente descritivas, enciclopédicas, decorativas, distantes da realidade vivida pelos alunos, onde o “decoreba”, ainda, acaba imperando. Contudo, nos dias de hoje, com a diversidade de tecnologias disponíveis, os professores tendem a modificar suas práticas docentes, levando em consideração não somente como o aluno demonstra-se em sala, mas como age no seu cotidiano e no relacionamento com a sociedade.

Nesse sentido, os métodos e as técnicas de repassar o conhecimento também sofreram alguns avanços. Pois, assim como em outras atividades humanas, o ensino de cartografia também vem sendo beneficiado com os avanços ocorridos nos últimos anos na informática e em suas ferramentas computacionais. Se no passado, a ferramenta principal no processo de ensino aprendizagem da cartografia era baseado somente em mapas impressos em atlas e em livros didáticos, na atualidade a diversidade de softwares e ferramentas disponíveis na internet possibilita aos professores uma atualização constante e o dinamismo das aulas que envolvem produtos cartográficos.

Nos mapas impressos em livros didáticos e em atlas escolares a realidade é mostrada de forma “estática”, figurativa e muitas vezes sem relação com o texto principal, em que o papel do professor enquanto intermediador para se alcançar o conhecimento depende muito da formação do docente, onde, caso o professor não tenha estudado a cartografia em sua formação superior, o ensino fica prejudicado. O ensino tradicional, apesar de ainda hoje estar presente, antigamente, era repassado majoritariamente em todas as escolas do país, e agora é visto, com menos força, em alguns poucos resquícios em que a educação tradicional ainda se mantém, onde a localização de objetos e fenômenos é simplificada pela apresentação de mapas – de forma figurativa, em que os mapas e seu uso não possibilitam aos alunos um caráter crítico sobre a realidade que está nas ações humanas.

Nos dias de hoje, a popularização da informática e o acesso a textos e a produtos cartográficos em formato digital, além da flexibilidade/facilidade no manuseio das chamadas geotecnologias (hardwares, softwares e técnicas direcionadas para a geração de geoinformação, ou seja da informação espacial/geográfica), facilitou as atividades produtivas de diversos indivíduos, não somente para os professores de geografia ou de outras ciências humanas, mas de profissionais de várias ciências que integram às suas atividades docentes o ensino do/e pelo mapa, além de outros sujeitos que utilizam essas geotecnologias em sua localização cotidiana, como o Sistema de Posicionamento Global – GPS, ou a visualização das imagens do Google Earth, ou em outros sites de empresas privadas e governamentais (figura 01 e 02). Essa facilidade gerada com o avanço da informática, aliada aos conhecimentos cartográficos desenvolvidos durante séculos de estudo, que agora estão dispersos nos computadores, tiram do docente aquele velho pretexto de que não sabe cartografia devido a sua formação superior deficiente.
Figura 01: Site I3GEO – Ministério do Meio Ambiente
Fonte: http://mapas.mma.gov.br/i3geo

            Todavia, apesar da grande importância do conhecimento apreendido em sala de aula no ensino superior, o número de textos, livros, softwares e tutoriais sobre cartografia, sensoriamento remoto, geoprocessamento e geoinformação em geral, permitem que qualquer indivíduo tenha acesso aos produtos cartográficos da era digital. Além disso, os sites, blogs e listas de discussão sobre essa temática vem se multiplicando diariamente, devido a facilidade do manuseio e ao fascínio que o ambiente computacional oferece para a confecção de produtos cartográficos. As figuras 01 e 02, dos sites do Ministério do Meio Ambiente e do Ministério das Cidades, demonstram essa realidade, onde não somente as empresas aderiram ao ambiente WebGis, mas também diversos órgãos públicos.
Figura 02: GeoSnic – Ministério das Cidades
Fonte: http://geosnic.cidades.gov.br/

             Os atlas digitais disponíveis na internet, juntamente com a tecnologia WebGis que vem sendo desenvolvida, com suas camadas vetoriais e raster, são a prova indiscutível da popularização causada por essa demanda crescente de usuários da cartografia e da geoinformação. Como reflexo, os produtos cartográficos também vem sofrendo adaptações em seus formatos de apresentação, como por exemplo a elaboração de Modelos Digitais de Terreno – MDT, anamorfoses (figura 03) ou outros cartogramas complexos (figura 04), entre outras “lógicas”, que também possibilitam a geração de produtos cartográficos antes poucos comuns, devido às complexidades matemáticas envolvidas na sua elaboração.
   
Figura 03: Anamorfose Indicando a População Brasileira por Estado.
Fonte: http://www.worldmapper.org/

Dessa forma, se antes o professor tinha que se preocupar com sua formação docente em nível de graduação e pós-graduação em sua área de estudo, atualmente a formação contínua (inter, trans e multi)disciplinar é imprescindível e pode ser buscada em cursos de curta duração em diversas Instituições de Ensino Superior (IES) no país. Essa educação continuada deve atender a demanda gerada pelo acesso que a internet oferece, disponível não somente ao professor, mas também ao seu alunado, cada vez mais questionador e ansioso por novos conhecimentos. Dessa forma, é mais comum nos dias de hoje não somente aprender a ler os mapas com as geometrias conhecidas dos continentes ou países, mas também cartogramas e anamorfoses que demonstram a realidade complexa que está por traz das formas reais existentes no espaço geográfico, como se pode observar nas figuras 03 e 04 em que a geometria dos lugares pode ser desconsiderada segundo a importância da temática analisada no produto cartográfico. Sendo, nesse caso, imprescindível o conhecimento anterior do espaço que está sendo estudado. 
 

Figura 04: Cenários Ambientais Brasileiros
Fonte: Política Nacional de Ordenamento Territorial - PNOT (2006)

Contudo, apesar dos avanços tecnológicos, essa formação contínua docente não deve desprezar os conceitos e categorias formulados durante séculos e que embasaram todos esses anos os conhecimentos cartográficos. Pois, não se deve confundir a tecnologia, ferramenta e/ou produto final, com a ciência que fundamenta todos os conhecimentos utilizados para a criação desses produtos. Onde, mais do que “apertar botões” o usuário – professor ou aluno, tem que saber ler, entender e interpretar a informação espacial plotada, de forma que possa gerar outros produtos que levem os seus alunos/leitores a outras formas de conhecimentos. Na figura 05 pode-se observar a janela inicial do programa Amiglobe, que é um software livre que pode ser utilizados pelos professores na dinamização das aulas com mapas e globos.

Figura 05: Software Educacional Amiglobe
Fonte: http://migre.me/8Wc8A

A tendência que se mostra aos usuários de mapas - e para o ensino de cartografia, é que os WebGis terão cada vez mais divulgação e se tornarão importantes ferramentas a serem agregadas ao processo de ensino-aprendizagem, devendo o docente respeitar, sempre, a faixa etária e o nível cognitivo do seu público-alvo discente. Sem o temor da defasagem, o professor agora tem que ultrapassar o papel de simples intermediário na explicação dos mapas e se tornar um leitor/mapeador consciente que, para a dinamização de suas aulas, deverá incorporar além do uso do livro didático, atlas impresso, músicas, filmes, visitas orientadas e outras práticas. Nesse sentido, os avanços (geo)informacionais vem complementar e tornar as aulas cada vez mais atrativas para um alunado cada vez mais curioso.

PARA SABER MAIS                     


SIT – Município de Ponta Grossa: http://geo.pg.pr.gov.br/webgis/map.phtml
Recursos Hídricos no Nordeste: http://atlas.srh.ce.gov.br/
Projeto Estrada Real: http://www.er.org.br/
Google Maps: http://maps.google.com.br/maps/ms?msa=0
Ministério do Meio Ambiente – MMA/I3GEO: http://mapas.mma.gov.br/i3geo
Min. Cidades - GEOSNIC: http://geosnic.cidades.gov.br/
Springweb: http://migre.me/8W9XU  
Atlas Escolar IBGE: http://migre.me/8W9WM

Softwares Educacionais:
 
Marble: http://edu.kde.org/applications/all/marble
Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil: http://www.pnud.org.br/atlas/
Atlas Geográficos Melhoramentos: http://migre.me/8W9NP
World Map 3D: http://migre.me/8W9Qa
StatPlanet: http://migre.me/8W9ST
SPRINGWeb: http://migre.me/8W9VZ

Google Earth: http://migre.me/8W9V7

StatCart IBGE: http://migre.me/8W9Uf  
Amiglobe: http://migre.me/8Wc8A




Por: Christian Nunes da Silva









[i] Publicado originalmente com o título: O Ensino de cartografia na era da (geo) informação. In: Revista Conhecimento Prático: Geografia, São Paulo, 10 out. 2011, p. 24 – 27.

segunda-feira, 11 de março de 2013

A “BESTIALIZAÇÃO” DA SOCIEDADE MODERNA: A RECRIAÇÃO DA IGNORÂNCIA?*

É surpreendente a maneira como os objetos, a televisão e a mídia em geral atuam no cotidiano da sociedade, dita “moderna”. Essa atuação pode ser, muitas vezes, maléfica, devido influenciar de forma pervertida ou deturpada a atitude das pessoas. Na programação televisiva, nos “horários de pico”, em que a audiência televisiva é maior, observamos a maneira apelativa que as principais emissoras de televisão utilizam para chamar a atenção do telespectador, como por exemplo: o uso indiscriminado de crianças influenciadas por adultos, geralmente seus pais ou empresários, a falar verdadeiras bobagens para que nós, telespectadores, possamos rir, fazendo com que as crianças sejam subestimadas na sua inteligência. Posso citar diversos outros exemplos que mostram cenas de sexo explícito ou baixarias com brigas ao vivo e vocabulário de baixo calão.

Apesar de todas essas apresentações de pouca vergonha – ou pouco bom senso, que deixam o telespectador alienado, ainda existem as novelas onde há poucas pessoas com baixo poder aquisitivo no enredo, os que aparecem algumas cenas nem podem ser chamados de pobres, pois suas casas e os objetos que possuem (carros, roupas, etc.), podem ser consideradas de nível econômico superior do que ao do pobre brasileiro que está assistindo. Além do que, existe a influência cada vez maior à prostituição masculina e feminina com o abuso das cenas de adultério. Imagine você, pai de família, a influência que uma novela dessas tem na cabeça de sua filha (o) menor de idade. Não quero com essas afirmações que o Brasil retorne ao regime de censurava, onde toda e qualquer forma de oposição era oprimida, porém, seria interessante que na programação da televisão brasileira, e na mídia em geral, houvesse um pouco mais de ética e decência no que vai ser apresentado e bom senso, também, proporcional ao horário em que as programações são mostradas, sem cair em um moralismo exacerbado. 

Com certeza chegamos ao fundo do poço no que diz respeito à “ética televisiva”, apresentada atualmente e que nos é imposta pelos grandes “dragões” da mídia, que criam, re-criam e descriam atores, pessoas outras que se tornam publicas por alguns dias (brothers) e cantores, estes últimos, muitas vezes, donos de uma voz horrível que fazem sucesso com músicas sem letra e danças ridículas (pocotó, pocotó...). Então, no momento em que você estiver na sua casa à noite ou em um domingo na frente da televisão (que a programação televisiva é paupérrima, no quesito cultura útil), ligue-a somente no horário do telejornal, tente ouvir uma música, alugue uma fita de vídeo, um DVD (que lhe possibilitem alguma aprendizagem) ou escolha o meio pelo qual a maioria está escolhendo – o meio da valorização da ignorância, da alienação, da bestialização, pois este é o caminho mais fácil de ser seguido e apreendido.

Em nosso tempo, todos os objetos e ações – ou sistemas de objetos e sistemas de ações, já possuem um discurso pré-definido, onde é possível se observar que esse discurso atual embutido, pré-existente ou pré-determinado nos objetos e nas ações, facilita a “recriação da ignorância” no/do indivíduo, pois esse sujeito torna-se incapaz de pensar sobre o discurso que já existe e cada vez mais incapacitado de fazer o discurso do todo. Sobre esse assunto, o geógrafo Milton Santos afirmou em sua obra que “os objetos têm um discurso, um discurso que vem de sua estrutura interna e revela sua funcionalidade. É o discurso do uso, mas, também, o da sedução. E há o discurso das ações, do qual depende sua legitimação. As ações necessitam de legitimação prévia para ser mais docilmente aceitas e ativas na vida social e assim mais rapidamente repetidas e multiplicadas. (SANTOS, Milton. Técnica, espaço, tempo: globalização e Meio-Técnico-Científico-Informacional. São Paulo: Hucitec, 1996. p. 103).

Contudo, é possível ainda fugir dessa teia midiática que nos envolve atualmente. Podemos ir ao encontro, também, de um instrumento, um objeto muito utilizado por nossos ancestrais, o qual eles denominavam de “livro”, que, além de ser difícil de serem procurados e encontrados em algumas cidades brasileiras (os bons, pois similarmente às boas músicas, também existem livros de pouco conteúdo), possuem custo elevado, frente ao poder aquisitivo da maior parte da população e não têm o incentivo adequado do Governo brasileiro para que se tornem mais acessíveis à população, para a grande maioria da população de baixa renda. Ao leitor, desejo-lhe que se encontrar um livro bom e barato, o que pode ser difícil, pois a qualidade, na maioria das vezes, é proporcional ao preço, estimo-lhe boa sorte e aproveite um momento em sua vida em que você pode adquirir o mínimo de cultura que não é lixo, pois, apesar de tudo, nenhum livro é ruim o suficiente para que não possamos aprender nada.
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* Publicado em originalmente em SILVA, C. N. A bestialização da Sociedade moderna: a recriação da ignorância?. O espaço do Geógrafo. Bauru, v.41, 2005, p. 3 - 3.